XXX DOMINGO DO TEMPO COMUM 23-10-2016

Homilia para o XXX Domingo do Tempo Comum

23 de outubro de 2016

 

Textos da liturgia: Eclo 35, 15b-17; Sl 33; 2Tm 4, 6-8.16-18; Lc 18, 9-14

 

Irmãs e irmãos,

            No início da quarta parte do Catecismo da Igreja Católica, que trata da oração cristã, lemos um bonito trecho, no qual o texto de Lucas que hoje meditamos é citado: “De onde é que falamos, ao orar? Das alturas do nosso orgulho e da nossa vontade própria, ou das «profundezas» (Sl 130, 1) dum coração humilde e contrito? ‘Aquele que se humilha é que é elevado’ (Lc 18, 14b). A humildade é o fundamento da oração” (Catecismo da Igreja Católica, n. 2559). A mensagem não é nada sutil: somente quem se sente necessitado de Deus pode abrir-se ao Evangelho. Este não pode ser recebido em um coração orgulhoso, bastante contente consigo; este coração já está cheio de si; não tem lugar para Deus. A crítica de Jesus é bastante dura para com aqueles que se fixam em suas boas práticas de piedade, mas que confundem estas, que são meios, com o fim, o encontro com o próprio Deus. Como dizia um antigo ditado chinês: “bobo é quem fica olhando para o próprio dedo, enquanto este aponta para o céu”.

            No trecho do livro do Eclesiástico que a liturgia de hoje nos apresenta, lemos sobre a especial atenção do Senhor pelo órfão e pela viúva. Juntamente com o estrangeiro, aqueles representam, na Escritura, os mais vulneráveis da sociedade. É a favor destes que o Senhor sempre se coloca. Mas não basta ser socialmente pobre. O Eclesiástico nos fala de alguém cujas “preces atravessam as nuvens” (v. 21): o humilde. E quem é este humilde? É aquele que é, sobretudo, um “realista”. Este realismo possui dois elementos: primeiro, a consciência que de Deus recebeu tudo, pois Dele nos vem a própria existência e, em segundo lugar, de sua pobreza. É a consciência clara de nossa imperfeição que nos abre à vivenciar a graça de Deus. Vive em um “ateísmo prático” quem pensa ser religioso e é auto-suficiente. O cristão sabe que sua vida é em comunhão com o Deus de Jesus Cristo. Diante de Deus, o homem não se anula. Antes, é convidado a ser Seu cooperador. O trabalho do homem se une à graça de Deus, que não retira nem diminui a liberdade e os talentos humanos, mas eleva-os, de um modo que sozinho o homem não é capaz.

            Ser humilde, não encerra, portanto, uma atitude negativa para consigo, com a humanidade ou com a vida. Pelo contrário. O humilde não postula que é impossível ser bom, viver de acordo com a vontade de Deus. Ele sabe, simplesmente, que não pode fazê-lo sozinho. No entanto, com o auxílio de Deus, ele pode cumprir o que o Evangelho lhe convida. Como lemos Jesus no dizer, no evangelho segundo João: “Sem mim, nada podeis fazer” (Jo 15, 5). Ensina Santo Tomás: Deus nos ensina pela sua lei (pelo Evangelho de Jesus) e nos ajuda com sua graça, a força que nasce de seu coração e vem em ajuda do homem, tanto nas grandes quanto nas pequenas coisas.

            Que Deus nos dê um coração humilde. É nesta humildade que repousa nossa possibilidade de crescimento enquanto mulheres e homens amados e criados à sua imagem e semelhança (cf. Gn 1, 27). A humildade é o bom adubo com o qual preparamos a terra na qual a semente da Palavra é plantada. E esta cresce, pela misteriosa mão do Único que pode fazer nascer a vida.
                                                                                                                   

Fr. André Tavares OP