XXXI DOMINGO DO TEMPO COMUM 30-10-2016

O CAMINHO POR ONDE ANDA JESUS

 

                Uma das expressões mais marcantes dos estudiosos da religião nas últimas décadas foi a declaração de que a fé cristã ela é dessacralizante. Trata-se do fato da afirmação de que Deus se fez homem. Em decorrência, nada mais é sagrado. Fica rompido definitivamente e categoricamente o espaço do sagrado e do profano. Por outro lado, é bem verdade, que podemos tomar esta mesma ideia em sentido oposto, tudo se torna sagrado. Não discutiremos a essência dessa tese, que bem seria oportuna no Natal do Senhor. Mas, ela é a linha que subjaz a mesa da Palavra neste XXXIº Domingo do Tempo Comum.

                A frase marcante do trecho que a Igreja hoje nos apresenta, não é só um desejo de Zaqueu (Lc 19,3). Mas um desejo de todo o cristão. E se tomarmos a intuição de fr. Bruno Cadoré, ao falar à Revista Família Cristã de Portugal, é de todos nós, a humanidade. Todos nós queremos ver Jesus. A humanidade deseja ver Jesus. O detalhe é como encontrarmos Jesus.

                Entretanto, este Deus escondido vai se revelando aos poucos, como bem nos alenta a leitura do livro da Sabedoria deste domingo (Sab11,22-12,2), livro que faz uma releitura do Gênesis em chave sapiencial.

                O caminho mais direto, sem embargo, vemos descrito no Evangelho. Para encontrar Jesus é preciso empenhar-se na busca sincera. Jesus não faz discriminação! Percebe e vem ao encontro: “Zaqueu, desce depressa, hoje irei a sua casa”(Lc 19,5). Apesar de chefe, Zaqueu tentou ficar mais alto do que era, artificialmente. E estava ainda à margem, porque numa árvore. Fora do ambiente normal de sua pessoa e das pessoas em geral. Mas Zaqueu teve o esforço de subir e sobretudo de descer da árvore. Jesus não está em cima, está embaixo. O Messias, na verdade, mais que o pantocrator, é simples. Muito mais que nos templos, somos convidados a caminhar para Ele, caminhando com Ele nas situações mais simples e cotidianas.

                Por isso, hoje queremos ver Jesus. E para vê-lo é preciso enfrentar as contradições do mundo e as nossas. Zaqueu era chefe da sinagoga, porém, pequeno. E teve que ser humilde para aceitar o autoconvite de Jesus para estar com ele. É a atitude de “descer”. Estar sobretudo em sua casa, no espaço de maior intimidade.

                Jesus se mostra onde não se espera. A experiência de hoje é desmitologizadora e ao mesmo tempo mistificante. Jesus vem ao nosso encontro quando não ligamos para as convenções. Ele vem ao nosso encontro na transparência da vida, no enfrentamento de preconceitos. No desafio de estar com os mais humildes e desprezados. Porque ele se mostrou atento a todos que estavam à margem. Jesus vem ao nosso encontro na mística de nossa vivencia cotidiana.

                Talvez o lugar de nos encontrarmos com Jesus seja enfrentarmos este momento tão difícil que o Brasil atravessa. De tantos discursos de reformas, sem, no entanto, que a vida dos menores seja a pauta do dia. Buscar lermos a história do Brasil. Um país, que sempre foi muito excludente. E pelo visto continua sendo. Onde muitas pessoas têm pouco conhecimento crítico da história e dos jogos de interesses que nela são disputados. Ajudaria retomar o pensamento de um Darcy Ribeiro, Florestan Fernandes ou Sergio Buarque de Holanda.

                A transparência de Deus, o Deus da revelação cristã está no cruzamento deste caminho de transcendência, na mística, de um Deus que toca o caminho de nosso contexto. O Deus que o Evangelho afirma ter visitado o seu povo não frequentando os templos e palácios, mas as estradas empoeiradas. A lógica da mesa da Palavra de hoje, parece que nos aponta que, ver Jesus, se trata de entender o desafio dos empobrecidos e encontrar ali, escondido, o transparente caminho por onde anda Jesus.

Por frei Helton Barbosa Damiani, OP

Mestre de Noviços,

vigário da Paróquia São Domingos,

 em Uberaba